Uma pesquisa divulgada nessa quinta-feira, 7, pela Fiocruz Minas e a Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – trouxe resultados alarmantes sobre as condições de vida, saúde e trabalho dos moradores de Brumadinho. A primeira etapa da pesquisa mostra uma alta concentração de metais como arsênio, manganês, cádmio, mercúrio e chumbo em adultos, crianças e adolescentes que vivem na cidade.
De acordo com os pesquisadores, os resultados apontam que, entre os adolescentes, alguns metais estão acima dos limites de referência, com destaque para arsênio total na urina (28,9% com mais de 10 μg/g creatinina), manganês no sangue (52,3% com mais de 15 μg/L) e chumbo no sangue (12,2% com mais de10 μg/dL). Já nos adultos foram encontradas elevadas proporções de níveis aumentados de arsênio total na urina (33,7%) e de manganês no sangue (37%).
O estudo feito em crianças de 0 a 6 anos de idade mostra também que, em todas elas, foi detectada a presença de pelo menos um dos cinco metais em avaliação, além dos já citados, cádmio e mercúrio. As análises apontaram que 50,6% das amostras urinárias apresentaram pelo menos um metal acima do valor de referência. O arsênio foi encontrado acima do valor normal em 41,9% das amostras analisadas e o chumbo em 13% delas.
As principais recomendações dos pesquisadores, diante deste cenário, são referentes ao monitoramento de fatores de risco para doenças cardiovasculares, ao acompanhamento de doenças respiratórias, à disponibilidade de serviço de suporte à saúde mental, a ações de promoção da saúde e à adequação dos serviços de saúde. Os dados foram coletados no segundo semestre de 2021. Em função da pandemia, a coleta de dados demorou a começar, já que inicialmente estava prevista para um período mais próximo do desastre.
Também chama atenção, no estudo divulgado, a referência a problemas respiratórios. Entre os adolescentes, quando perguntados se já haviam recebido diagnósticos médicos de doenças crônicas, as respostas mais frequentes foram asma ou bronquite asmática, mencionadas por 12,3% dos entrevistados. Esse percentual é maior entre os moradores de algumas regiões, chegando a 23,8% entre os residentes do Parque da Cachoeira e 17,1% entre os que vivem no Córrego do Feijão, regiões diretamente expostas ao rompimento da barragem de rejeitos. Pneumonia foi citada por 10,9% dos adolescentes, mas, entre aqueles que moram no Pires, região banhada pelo Rio Paraopeba, que foi atingido pela lama, esse percentual foi de 16,7%.
Na população adulta, quando perguntada se algum médico já havia feito o diagnóstico de doenças crônicas, as mais citadas foram hipertensão (30,1%), colesterol alto (23,1%) e problema crônico de coluna (21,1%), com pequenas variações entre as regiões. O diabetes foi prevalente em 9,8% da população adulta. Esse resultado mostra estimativas maiores que as encontradas na Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada pelo IBGE em 2019, que estudou a população do país com 18 anos ou mais e verificou hipertensão em 23,9% dos brasileiros, colesterol alto em 14,6% e diabetes em 7,7%.
Em relação às crianças, 49% dos responsáveis observaram alterações na saúde dos filhos após o desastre. Os principais problemas de saúde apontados referem-se ao sistema respiratório e alterações na pele. O relato de alergia respiratória em Parque da Cachoeira, localidade diretamente atingida pelo desastre, foi quatro vezes mais frequente do que os referidos em Aranha – região mais distante da área atingida. Nas localidades com maior exposição a poeiras da mineração, Parque da Cachoeira e Tejuco, os relatos de infecção da pele foram três vezes mais frequentes do que em Aranha.
“Os resultados sobre o diagnóstico médico de doenças crônicas, bem como sobre sinais e sintomas, demonstram uma elevada carga dessas condições para a população de Brumadinho, podendo refletir na procura por serviços de saúde. Dessa forma, é importante que se tenham ações para acompanhamento dos fatores de risco cardiovascular e doenças respiratórias, além de ações de promoção da saúde. Os resultados também mostram a necessidade de ter um olhar mais atento para as regiões com maiores percentuais dessas questões de saúde, que podem estar relacionadas às condições ambientais, como água e ar, e que precisam ser melhor investigadas. É importante o monitoramento da saúde dessa população porque há uma dinâmica. No início do trabalho o problema principal era a lama, depois, a poeira, mais para frente será outra questão”, destaca o pesquisador da Fiocruz Minas Sérgio Peixoto, coordenador-geral da pesquisa.
Saúde mental
Outro ponto avaliado pelos pesquisadores foi a questão da saúde mental da população do município. O diagnóstico de depressão entre os adultos encontrou um percentual de 22,5%, o dobro dos 10,2% relatados pela população adulta brasileira, de acordo com o PNS de 2019. Já a ansiedade ou dificuldades para dormir foi reportado por 33,4% dos entrevistados com mais de 18 anos de idade. Nos adolescentes, 10,4% relataram diagnóstico médico de depressão e 20,1% de ansiedade.
A aplicação das escalas no público com mais de 18 anos mostrou que 29,4% apresentavam episódio depressivo e 19,2% transtorno de ansiedade. Entre os adolescentes, mostrou que 28,2% estão depressivos e 15,6% com transtornos de ansiedade.
O jornal Folha de Brumadinho procurou a Vale para falar sobre a pesquisa. Em nota, a empresa disse que não teve acesso ao estudo, mas que irá analisar os resultados tão logo o tenha. A Vale reforçou ainda que não há registros nas comunidades locais de casos de intoxicação por metais pesados em decorrência do rompimento da barragem B1, em 2019.
“A empresa também monitora níveis de material particulado em suspensão (frações inaláveis menores que 10µm e frações respiráveis menores que 2,5µm) nas comunidades impactadas de Brumadinho e, até o momento, os resultados desses monitoramentos estão a níveis de segurança adequados à saúde da população” diz a nota.
Os relatórios completos dos projetos Saúde Brumadinho e Bruminha, apresentando todas as análises realizadas, estão disponíveis no site da pesquisa: https://www.cpqrr.fiocruz.br/saudebrumadinho/
Fonte: Agência Fiocruz