Vacina contra a Covid: medo ou esperança?
Por João Flávio Resende
Não é novidade para ninguém o alcance mundial do novo coronavírus. A doença por ele provocada, batizada de Covid-19, já matou mais de 1,5 milhão de pessoas em todo o mundo, sendo cerca de 180 mil pessoas somente no Brasil, com quase 7 milhões de casos confirmados (dados conferidos no momento em que escrevia este artigo). Para o nosso país, um dos dados mais preocupantes é sobre a letalidade da doença por aqui. O Brasil tem 2,7% da população mundial e 12% do total de mortes.
A Covid se tornou muito mais mortal em países cujos governantes negaram ou duvidaram da gravidade da doença, como Itália, Reino Unido, Estados Unidos e, claro, Brasil. Por não terem montado um plano nacional para o enfrentamento desta pandemia, estes países acordaram muito tarde para tentar conter a doença, que já havia se espalhado rapidamente, fazendo vítimas fatais de praticamente todas as idades (e não apenas nos chamados “grupos de risco”, como se acreditava no início).
Pegar a Covid é uma loteria. É possível o paciente não ter absolutamente nada, como é possível ficar com sequelas graves após se recuperar, como é possível morrer. E as histórias de familiares que se contaminaram e morreram uns com poucos dias de diferença dos outros, e até mesmo com mortes de familiares no mesmo dia, se multiplicam aos milhares. Some-se a isso um outro fato que potencializa a dor das perdas: não poder sequer velar os corpos e ter que sepultar rapidamente para evitar ainda mais contaminações.
Posições governamentais estão sendo determinantes para controlar ou não a pandemia
Apesar de todos os alertas da Organização Mundial de Saúde (OMS), o governo brasileiro se fez de morto, negou a existência da pandemia, derrubou dois ministros da Saúde que, de alguma forma, se colocaram a postos para enfrentar a doença e, somente depois de muita pressão, procurou aliviar o impacto na economia com o auxílio emergencial. Mesmo assim, o presidente da República continuou fazendo pouco da pandemia, com as já conhecidas frases que não precisam ser reproduzidas aqui.
Com a falta de uma força-tarefa e de uma coordenação nacional para o enfrentamento da pandemia, governadores e prefeitos tiveram que “se virar” sozinhos, cada um com ações diferentes: barreiras nas entradas das cidades, decretos locais, ações de fiscalização, construção de hospitais de campanha, realização de campanhas educativas e informativas. Houve várias ações para evitar aglomerações, como restrições ao comércio, proibição de atividades coletivas e obrigatoriedade do uso de máscaras (comprovadamente eficazes para frear a transmissão do coronavírus), sem falar na necessidade de higienização constante das mãos.
Com a polêmica criada em torno da queda da atividade econômica, vários prefeitos e governadores se depararam com o dilema “se fechar a economia, as empresas morrem; se abrir, as pessoas morrem”. Pois se tivéssemos adotado um fechamento rigoroso no início do contágio, hoje teríamos salvado milhares de vidas e a atividade econômica poderia ter sido gradualmente retomada. E não teríamos o descalabro de hoje: por mais que tentem negar, estamos, sim, no meio da segunda onda da Covid-19, enquanto parte da população está tocando a vida e aglomerando como se a pandemia já tivesse acabado.
O desenvolvimento das vacinas
Enquanto isso, cientistas de várias partes do mundo se desdobram, desde a descoberta da doença, em grandes pesquisas para desenvolvimento de vacinas contra a Covid, que, agora já desenvolvidas e esperando aprovação de órgãos de controle sanitário em todos os países, aqui no Brasil viraram motivo de disputas políticas entre a Presidência da República e governos estaduais, sobretudo o Governo de São Paulo. Isso sem falar em uma série de informações duvidosas e/ou falsas quanto às vacinas desenvolvidas pela Rússia e pela China.
Das seis vacinas desenvolvidas, quatro estão sendo testadas no Brasil: CoronaVac/Sinovac, Oxford/AstraZeneca, Johnson e Pfizer/BioNTech, sendo que esta última já está em uso desde o dia 8 de dezembro no Reino Unido. Enquanto isso, o governo brasileiro, que negou a pandemia desde o início, agora é pressionado de todos os lados para aprovar e aplicar as vacinas. Neste momento, os integrantes do governo batem cabeça: não conseguem desenvolver um plano de vacinação consistente e ninguém no Brasil tem ideia de quando poderemos ser vacinados, já que, no momento em que escrevia este texto, nenhuma delas ainda havia sido aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Ao longo da História, grupos contrários a vacinações em massa já inventaram todo tipo de teoria da conspiração e, agora, não está sendo diferente. Particularmente, vejo nas vacinas a única esperança de deter essa doença terrível e imprevisível. E espero que as vacinas estejam logo à disposição de todos os brasileiros, sejam quais forem, independentemente da origem.
Coronavírus veio para ficar
Cientistas renomados dizem que será praticamente impossível erradicar a Covid e que a população precisará de campanhas periódicas de vacinação para se manter imunizada, tal como acontece hoje como doenças como a gripe. Pode ser necessária também a adoção periódica de medidas locais, regionais ou mesmo nacionais para conter possíveis focos da doença no futuro. O coronavírus sacudiu toda a Humanidade e, depois dele, nada mais voltará ao antigo normal.