A Vallourec Mineração anunciou que irá começar em breve, a obra de adequação do vertedouro da barragem Santa Bárbara, localizada no Distrito de Piedade do Paraopeba. Segundo a empresa, a obra segue as exigências da ANM – Agencia Nacional de Mineração. A barragem teve seu nível de segurança elevado de 0 para 1, após inspeção da ANM e por isso, segundo a empresa, a necessidade de ampliar a vazão de água da estrutura. A classificação do nível de segurança de barragens vai de 0 a 3, sendo que, 0 significa totalmente segura e 3 é o estado crítico da estrutura, com risco eminente de rompimento.
De acordo com a Vallourec, a barragem Santa Bárbara foi construída na década de 90 e tem por objetivo conter o carreamento de sedimentos da área da cava da mina Pau Branco, principalmente durante o período chuvoso. “A estrutura é de controle ambiental e não recebe rejeitos do processo de produção. Sua função é controlar a vazão constante, evitando enchentes ou secas, além de conter o carreamento de resíduos sólidos e o assoreamento no córrego Piedade” explica Fernando Batista, Gerente de Geologia, Planejamento e Barragens.
Durante a apresentação do projeto aos representantes de comunidades locais, no último dia 20 de abril, a Vallourec garantiu que a barragem não possui nenhum problema na sua estrutura física e que realiza inspeções diárias no local, conforme exige a legislação.
Líderes comunitários contestam a empresa. Para o representante da comissão SOS barragem, criado em 2019, após o rompimento da barragem da Vale, na Mina Córrego do Feijão, Reginaldo de Souza Rosa, a barragem Santa Bárbara possui uma grande quantidade de sedimentos de minério, um verdadeiro repositório de lama tóxica. “Nós estamos falando de uma barragem com mais de 20 anos e que mais de 60% dela são de sedimentos. O que nós queremos é que esta barragem seja descomissionada e que Piedade do Paraopeba e região fique totalmente livre deste tormento, de conviver diariamente com isso sobre nossas cabeças. Já vivenciamos este trauma de perto, com o rompimento da barragem da Vale, e não queremos e não podemos aceitar isso mais em nossas vidas, afirmou Reginaldo.
A comissão emitiu essa semana uma nota de repúdio sobre a obra na barragem e exigiu uma resposta das autoridades e dos órgãos de fiscalização. Um dos principais pontos de questionados pela comissão é a falta de transparência por parte da mineradora, que segundo eles, excluem parte da comunidade nas discussões e a falta do licenciamento ambiental para a realização da obra. A comissão chamou a atenção também para as várias famílias que moram na zona de auto salvamento e inclusive a Escola Municipal Padre Xisto, que está na área de risco, onde estudam centenas de crianças. “Nenhuma ação foi feita de retirada dessas famílias destes locais e nem mesmo a questão do funcionamento da escola durante esse período de obras. Estamos à mercê desta situação, sem nenhuma garantia de segurança. Além disso, a empresa começará uma obra, sem as devidas licenças ambientais, o que nos deixa mais preocupados ainda sobre essa situação da barragem” ressalta Reginaldo.
O jornal Folha de Brumadinho procurou a Prefeitura para falar sobre as intervenções que serão realizadas no local, e em nota, o órgão afirmou que não tem autonomia sobre os processos de licenciamento ambiental das atividades minerárias, mas que o corpo técnico da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e da Defesa Civil Municipal está acompanhando todo o processo de licenciamento da empresa juntos aos órgãos responsáveis e irá acompanhar também as obras no local.
Já a Vallourec afirmou que deu início ao processo de licenciamento ambiental, com a entrega do projeto aos órgãos competentes e que a obra precisa ser feita agora, como exigência do nível de classificação, além de aproveitar o período de seca que se inicia. A expectativa da empresa é concluir a obra até novembro deste ano.
No final de 2019, a Vallourec instalou sirenes e placas nas comunidades de Piedade do Paraopeba e Marques, alertando sobre as áreas de possíveis inundações e realiza simulações na região.
Nota de Repúdio
Comissão SOS Barragem Piedade do Paraopeba
Obra Projeto Vertedouro Barragem Santa Bárbara – Vallourec Mineração
Piedade do Paraopeba, distrito de Brumadinho, é uma das vilas mais antigas de Minas Gerais, datada do período dos Bandeirantes e com uma história de quase 350 anos. Sua linha do tempo foi contemplada com uma das mais belas e antigas igrejas pré-barrocas de Minas. Além disso, Piedade conta com um povo simples e acolhedor, sem contar suas paisagens deslumbrantes que levam qualquer ser a uma tranquilidade infindável.
Se continuássemos descrevendo aqui as qualidades desse vilarejo, poderíamos dedicar um artigo inteiro apenas para isso. Mas, infelizmente, não é o momento mais propício para tal fim e vamos explicar o porquê. Piedade se encontra, enquanto você leitor faz esta leitura, assombrada por um fantasma que assombrou Mariana e, mais recentemente, Brumadinho. Na primeira, causando uma das maiores tragédias ambientais que o mundo já viu. Na segunda, um momento doloroso, com um número incontável – e aqui dizemos incontável pelo simples fato de nem se ter encontrado todos os atingidos – de vítimas, transcendendo o significado de tragédia e chegando ao que podemos chamar de Assassinato em Massa. Sim, meu caro leitor, um assassinato em massa vindo da maior mineradora de nosso País e uma das maiores do mundo. Mas não nos resta apenas olhar para o passado e lamentar os ocorridos, pois mesmo depois de tantos exemplos, de tanto sofrimento, parece que não aprendemos. Continuamos sendo assombrados pelo mesmo fantasma, pois Piedade do Paraopeba corre neste exato momento o mesmo risco das situações supracitadas. Sim, meu caro leitor, Piedade do Paraopeba se encontra ameaçada por uma Barragem. Você, que está lendo, deve se perguntar, mas porque, será que não aprendemos? Não, não aprendemos. A ganância fala mais alto. O individualismo das grandes corporações e do Estado, fala mais alto. A falta de transparência com a população é escancarada, levando pessoas a se calarem sob a ameaça de perderem seu emprego, pelo simples fato de que elas, coitadas, precisam sobreviver ao seu dia a dia, mal sabendo que tal sobrevivência se encontra sob uma ameaça diária desse fantasma implacável que é uma barragem.
Como exemplo recente de descaso e desvio de foco, temos a obra do Projeto Vertedouro Barragem Santa Bárbara. Essa obra não contribui em nada para a comunidade. A mesma não elimina o risco existente na zona de auto salvamento e nem a possibilidade de extinção do centro histórico de Piedade do Paraopeba e seus quase 350 anos. Quanto à transparência, a única mensagem que temos é que a obra começará a todo custo, independente de licença ou não, foi o que determinaram para Piedade do Paraopeba.
Já perdemos mais de quatro nascentes que existiam na comunidade, sem nenhuma preocupação com a reativação das mesmas ou se quer uma punição dos responsáveis. Com a Barragem Santa Bárbara, a população se torna refém de mais uma ameaça, agora contra nossa fauna, nossa flora, nossa população e também contra um patrimônio de mais de três séculos de existência. Como já citado, essa obra de Vertedouro não agrega nada ao local, o correto, o justo e seguro para o povo, é o descomissionamento da barragem Santa Bárbara, criada e utilizada como um repositório de lama tóxica. Só assim, estaremos preservando nosso bem mais precioso, a Vida. É o que necessitamos urgentemente.
A corporação responsável e o Estado não estão agindo com transparência. Estão ignorando a comunidade. Utilizando-se de uma organização denominada “Comunidade viva” custeada por ela mesma para ludibriar a população. Depois de tudo que aconteceu em Brumadinho esperávamos mais, pelo menos por parte do Estado, que tem por obrigação buscar o bem estar da população e não o bem estar das grandes corporações. A prefeitura deveria atuar no sentido de pedir o descomissionamento das barragens. É um fato que barragens não são uma estrutura segura.
Pagamos um preço alto com a VALE. Sabemos que o município precisa de arrecadação, mas sabemos também que existem tecnologias que substituem as barragens. Ignorar isso é estar a serviço das mineradoras e contra a população. Se seguir assim, a gestão “Neném da Asa” entrará para história como a gestão que deixou a mineração Vallourec extinguir o centro histórico de Piedade do Paraopeba, tudo feito em troca de migalhas com a conivência de lideranças políticas e de fé pública. Estão condenando Piedade do Paraopeba à extinção, uma vez que não se pode ter morador em zona de auto salvamento e o centro histórico está todo dentro dessa zona, que vai de Piedade até a divisa com Marques e com Aranha, com centenas de moradores em risco. Tal fato, fica explícito pela resolução abaixo.
RESOLUÇÃO Nº 4, DE 15 DE FEVEREIRO DE 2019 – inciso XI do art. 2º da Lei nº 13.575, de 2017.
Art. 3º Ficam os empreendedores responsáveis por barragens de mineração inseridas na PNSB, “independentemente do método construtivo” proibidos de manter ou construir, na Zona de Auto Salvamento – ZAS:
I – qualquer instalação, obra ou serviço, permanente ou temporário, que inclua presença humana, tais como aqueles destinados a finalidades de vivência, de alimentação, de saúde ou de recreação.
A reunião da obra supra citada foi feita de última hora. A comissão SOS Barragem Piedade em momento algum foi convidada. Essa reunião foi agendada pela “Comunidade Viva” e custeada pela Vallourec. A mesma realiza essas reuniões com grupos fechados, ligados a colaboradores e projetos patrocinados pela própria empresa, sem se comunicar com a comunidade.
Tal situação é inadmissível e criminosa com a população. O Estado deveria cuidar mais do povo. Temos muitas pessoas debaixo dessa barragem, o que inclui uma escola inteira com centenas de crianças o dia todo dentro da zona de auto salvamento e ninguém faz nada. Estão preocupados só com os royalties (dinheiro) da mineração. Depois do que aconteceu em Brumadinho esperávamos uma administração mais séria no que tange à relação com a mineração. Mas, infelizmente não é o que temos presenciado. Talvez esteja nesta situação lastimável vivida atualmente em Piedade do Paraopeba a explicação para o descaso que aconteceu no Córrego do Feijão, do qual o final triste e sombrio todos nós conhecemos.