Reprodução: matéria da Faculdade de Medicina da UFMG – www.medicina.ufmg.org.br
Estudo com participação da Faculdade de Medicina da UFMG aponta para altas prevalências de sintomas psiquiátricos entre a população de Brumadinho após o rompimento da barragem da mina Córrego do Feijão, da mineradora Vale, ocorrido em 2019. Entre os temas pesquisados estão depressão, transtorno de estresse pós-traumático (TEPT), ansiedade, ideias de morte/automutilação e pior qualidade do sono.
Os sintomas depressivos foram a condição mais prevalente (29,3%), seguidos pelos sintomas de TEPT (22,9%) e sintomas ansiosos (18,9%). Os piores cenários foram entre mulheres, idosos, moradores da área mais próxima à mineração e pessoas com escolaridade de nível médio. A coleta foi feita por meio de entrevistas entre os meses de junho e dezembro de 2021. Foram incluídos na amostra 2.740 moradores adultos da cidade.
A professora do Departamento de Saúde Mental (SAM) da Faculdade de Medicina da UFMG, Maila de Castro, explica que esses grupos estão mais vulneráveis ao adoecimento em saúde mental e que precisam de uma atenção especial das autoridades. Além disso, a vulnerabilidade ao adoecimento é mais presente quanto maior a exposição ao desastre. “A vida ameaçada, a destruição de sua casa ou perder alguém querido são situações comuns em desastres e esses momentos são traumáticos para as pessoas”, aponta.
Chamou a atenção dos pesquisadores a semelhança da prevalência dos sintomas depressivos encontrados na escala de rastreio aplicada em Brumadinho com o alto índice de diagnósticos de depressão em Mariana, apontados no relatório da Pesquisa sobre a Saúde Mental das Famílias Atingidas pelo Rompimento da Barragem do Fundão em Mariana (Prismma), que chegou a 28,9%. Essa prevalência é cerca de cinco vezes maior do que a descrita pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para a população brasileira, em dados de 2015.
A pesquisadora entende que os dados reforçam a magnitude dessas tragédias. “Apesar de termos a percepção de uma resposta mais imediata de órgãos públicos e sociedade civil se compararmos com a tragédia em Mariana, o que vemos nas pesquisas é uma similaridade entres os afetados, revelando que o impacto na saúde mental é muito grande”, enfatiza.
A pesquisa faz parte do Projeto Saúde Brumadinho, coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz em Minas Gerais (Fiocruz Minas) e pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com participação da UFMG. Também apoiou a iniciativa o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). O artigo foi publicado na Revista Brasileira de Epidemiologia e, além da professora Maila de Castro, também participou da pesquisa o professor do SAM Frederico Garcia. O financiamento é do Ministério da Saúde.
O artigo ressalta que a coleta de dados ocorreu em 2021, durante a pandemia de covid-19. Nesse período, estudos de diferentes países, incluindo o Brasil, mostraram altas taxas de transtornos psiquiátricos devido às medidas de distanciamento social. Assim, a alta prevalência de sintomas psiquiátricos em Brumadinho pode ser resultado, também, do impacto negativo da pandemia e não apenas pelo rompimento da barragem.
Agora, a expectativa da equipe é seguir o acompanhamento longitudinal, para que seja possível acompanhar a saúde do grupo ao longo dos próximos anos e traçar relações de causalidade.
Projeto Saúde Brumadinho
O Projeto Saúde Brumadinho é uma pesquisa coordenada pela Fiocruz Minas e pela UFRJ, com participação da UFMG, que avalia as condições de saúde daqueles que vivem no município de Brumadinho. Essa pesquisa foi solicitada pelo Ministério da Saúde e visa produzir informações importantes sobre as condições de saúde da população residente no município, auxiliando o serviço de saúde a oferecer melhor atendimento aos moradores.
Os primeiros resultados foram publicados em dossiê na edição atual da Revista Brasileira de Epidemiologia, no dia 28 de outubro. São 13 artigos e um editorial que analisam a situação pós-rompimento da barragem. Além do Projeto Saúde Brumadinho, a iniciativa contempla o Projeto Bruminha, realizado com crianças de até quatro anos de idade no momento do rompimento.
A professora Maila de Castro celebra essa parceria entre as instituições. “Houve grande mobilização de órgãos do Estado e da sociedade civil, o que é muito positivo. Esse é mais um exemplo da Universidade cumprindo seu papel de transformação social e de colaboração multidisciplinar, em um grande esforço da ciência brasileira”, finaliza.